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Sem qualquer correção jornalística, esta página dentro do site do midsummer madness é uma das mais queridas e esperadas em quase 19 anos de zine e gravadora. Procurei durante meses (para não dizer anos), alguém que escrevesse este texto de maneira menos parcial. Não achei. Decidi escrever eu mesmo o quanto eu amo esta fitinha! De novo, sem nenhum compromisso em contar a verdade dos fatos, aqui vai somente a minha opinião.

 

“Early Demo(ns)” é de um dos melhores registros nacionais de todos os tempos, lançado em 1989, em fita-demo. Eu recebi esta fita de uma amiga de São Paulo com quem eu me correspondia por carta. Era uma cópia de uma cópia que ela tinha da primeira demo de uma banda de Piracicaba chamada Killing Chainsaw. Não tinha capa e o título era “Gravado Nos Infernos”. A primeira audição foi uma porrada! Na época eu só ouvia “Sister” do Sonic Youth, “Bizarro” do Wedding Present e “Stooges” do Stooges. Dai a “Nos Infernos” começa com distorções gratuitas de “Serpent and the Rainbow” e continua com guitarras tocadas à dente na “Another Man’s Heart”.

 

“Que diabos é isso!?! A Érica deve ter gravado uma outra banda gringa qualquer e me mandou como se fosse o Killing Chainsaw!!!”, foi o que eu pensei.

 

O Killing Chainsaw que eu conhecia em 1989 tinha apenas 2 músicas num vinil chamado “Enquanto Isso” que trazia “Lollypop” e “Prudence”. Pra mim, eram duas pérolas difíceis de se igualar. Não parecia possível que uma banda conseguisse manter a genialidade daquelas duas músicas. “Prudence” tem uma bateria frenética no melhor estilo Wedding Present e um refrão surrreal “like you dooo”. Lembro que levantei da cadeira, aumentei o som e sai pulando pelo quarto. Coisas de um adolescente de 15 ou 16 anos. Ouvi mais uma vez, e mais uma, e toda vez que ouço “Prudence” saio tocando air-drum enlouquecidamente.

 

Dai para frente, o jogo estava ganho. A gravação era muito boa para os padrões 88-89 do underground brasileiro, tanto que a master que vocês podem ouvir e baixar ai ao lado é desta mesma fitinha BASF, cópia da cópia que a tal amiga me mandou. Fico imaginando a master que o Rodrigo (vocalista e guitarrista do Killing Chainsaw, atualmente no Grenade) tinha e diz ter perdido. Só para aumentar o drama, descobri mais tarde que o tal “Nos Infernos” era a casa de um deles, acho que do próprio Rodrigo, e lá foi gravada num porta-estúdio Tascam de poucos canais. Sentiu o drama?!

 

A esta altura eles já estão berrando “pop! pop! lollypop, pop, lollypop” nos seus ouvidos.

 

A quantidade de cópias que fiz desta fita para os amigos não está no gibi… Primeiro toda Niterói-indie: Fábio (vocalista do Second Come na época), Leandro (do Squonks, depois Stellar), Bia, Cadu (na época nas Drivellers e depois no Stellar). Eu achava (e ainda acho) que o mundo não podia acabar sem que todos ouvissem esta maravilha. E foi esta fita que literalmente criou, mesmo que inconscientemente, a gravadora midsummer madness. Foi por causa desta fita e do clima soturno de “Demise Ditty” (porra, ninguém no Brasil ainda tinha gravado uma “we will fall” à la Stooges, que entrasse no meio do disco, que tivesse mais de 2 minutos e que fosse esquisita) que eu resolvi inventar a tal fita cassete que seria encartada na próxima edição do fanzine midsummer madness com músicas das bandas que eu gostava.

 

Devo ter visto 2 ou 3 shows do Killing Chainsaw, todos eles em São Paulo. Se foram mais do que isso e eu não me recordo, provavelmente foi porque “something was happening in the other side of my brain”. Me lembro de dois deles, ambos no Espaço Retrô, em Santa Cecília, SP. Um foi o primeiro que vi. Estava bebum demais, tinha apenas 16 anos e tinha entrado no Retrô com identidade falsificada. Me lembro que Gozo (o guitarrista) quebrou a guitarra numa coluna de concreto no final do show e eu só pensava “caralho, que isso!!” O baterista Rodrigo (e ainda tem essa, eram 3 Rodrigos na banda: o Guedes, guitarra e voz, atual Grenade; Rodrigo Gozo, o tal guitarrista insano; e Rodrigo B, de baterista. O baixista era Gerson, coitado…) Mas então, me lembro que o baterista Rodrigo realmente mantinha o tempo acelerado das músicas da demo e às vezes até tocava mais rápido. Era muita adrenalina. Este primeiro show nem foi tão bom, microfonias do começo ao fim, som do Retrô caindo aos pedaços e Nick Cave na platéia distraindo o público do show.

 

Já o segundo show foi o mais foda de todos. Já contei esta estória numa edição sobre o rock brasileiro da Revista Bizz. Diz assim: “O Killing Chainsaw, de Piracicaba, completava com as duas bandas anteriores (Second Come e Pin Ups), a tríade desta cena outsider do começo dos anos 90. (…) Uma noite em São Paulo, quando o Cocteau Twins se arrastava no palco de uma grande casa de shows, a poucos quilômetros dali, no minúsculo Espaço Retrô, o Killing Chainsaw demolia tudo. Sinal dos tempos: apesar do amadorismo e das dificuldades, os pioneiros desta fase do rock independente brasileiro haviam atingido a maturidade criativa. Dentro de uma cena lembrada apenas como derivativa, todos que presenciaram esta noite em São Paulo chegaram à mesma conclusão: “às vezes gostamos mais do nosso indie do que do indie que julgávamos intocável, como o Cocteau Twins”. Sofrendo dos mesmos problemas do Second Come para gravar um disco, o Killing Chainsaw vendia centenas de fitas cassete e foi, da tríade, a última banda a gravar seu vinil. O disco, intitulado apenas Killing Chainsaw, saiu pela gravadora Zoyd de São Paulo que lançou na mesma leva, em 1992, o vinil do projeto acústico do Pin Ups, Gash.

 

Lie is violent”, era a que mais agradava a indiezada Niteroiense. Guitarras madchester recheadas de wah-wah e um baixo de fazer inveja ao Happy Mondays. Mas que carajos, os caras já escutaram tudo mesmo! De Wedding Present a Happy Mondays. E melhor, faziam destas audições suas próprias músicas, ainda mais legais. Entendeu de onde vem o orgulho de gostar mais do Killing Chainsaw do que do Cocteau Twins???

 

O Killing Chainsaw foi uma das últimas bandas a gravar seu disco, em vinil, pela Zoyd. Bom disco, mas pra mim, nada supera esta demo. De cabeça, sem pesquisar, sei que a discografia deles é este vinil pela Zoyd, já com Pedrinho na bateria, que saiu junto com o "Gash" e o “Slim Fast Formula” lançado pela Roadrunner em 1994, quando a banda já estava numa praia muito mais pro hardcore do que pra guitar (como se falava na época).

 

Na fitinha, uma versão para Beatles, “Paperback Writer”. Eu me lembro de achar ousado pois na minha adolescência de indie xiita, Beatles = “Michele” e “Yellow Submarine” além de todos os ié-ié-iés que eu achava muito bobinhos. É, verdade seja dita, eu não gostava de Beatles. Mas dai os caras começaram a mostrar o lado bom do quarteto de Liverpool.

 

Mousetrap” foi uma das primeiras músicas de bandas nacionais que eu discotequei na minha vida. A ocasião foi um show do Second Come no Clube Sírio Libanês em Botafogo no Rio de Janeiro, que eu fiquei responsável pelo som ambiente… e lá foi a fitinha pros altos falantes. “Nos Infernos” tinha uma capinha diferente desta. “Early Demo(ns)” tem esta capa especial ai ao lado feita pelo próprio Rodrigo Guedes. A minha era um desenho de uma serra elétrica de um HQ da época.

 

Early Demo(ns)” termina com o clássico para a posteridade do Killing Chainsaw em sua versão original: “Evisceration”. Fui buscar no dicionário o que significava. Maluco, os caras tinham um inglês sofisticado, que nem mesmo a pronúncia evisceratchon machuca.

 

Enfim, “Early Demo(ns)”, como foi renomeada por Rodrigo, é o resumo do que eu considero clássico.

 

 

  • Origem:

Álbuns em Destaque

Slim Fast Formula
1994 / Álbum
Killing Chainsaw
1992 / Álbum