Pular para o conteúdo principal
KYTE - Kyte

Muitos têm o dom da arte. Nasceram com ela, simplesmente. Autodidatas? Sorte? Predestinação? Não importa. Menos ainda quando a obra artística te atordoa, te hipnotiza e te joga em planos oníricos-extra-sensoriais em pelo menos 40 minutos de um dia na sua vida. Melhor ainda quando algo é obscuro, quando a descoberta parte de sua própria superação de curiosidade. Da vontade gananciosa de ir além do que já se encontra estereotipado, do que apresenta fórmulas pré-concebidas e daquilo que está condensado no bem-querer poderoso da mídia.

Cinco componentes com apenas os primeiros nomes (Tom, Nick, Scott, Ben e Jamie). São de Leicestershire, Reino Unido. Poucas informações pela internet. Indefinição de capa. De semelhanças. De influências. Cria-se todo um trabalho de investigação. De criar seu próprio julgamento na audição desse disco. No myspace, cita-se um álbum realizado no Japão. Também citam a existência de um mini-álbum. Sabem de uma coisa: não quero ler mais nada que não esclareça! Quero me afundar nessa sonoridade. Se vou encontrar mais detalhes, talvez seja daqui a um ano (a propósito do que acontece com o Vampire Weekend neste ano).

Sete faixas. Épicas, quilométricas, bucólicas e atmosféricas. Inevitavelmente - e não que eu precisasse disso -, vem lembranças de algumas bandas ou estilos à mente: Eluvium, Sigur Rós com guitarras comportadas, post rock, ambient e outros. Faço três recomendações: ouça no escuro de um quarto numa noite silenciosa, esqueça comparações (pois nem eu as consegui fazer) e tenha um ótimo fone de ouvido conectado ao seu aparelho.

‘Planet’ é a porta de acesso à esta inesquecível viagem. Guitarras dedilhadas, bateria quase sonolenta, vocais suaves, sintetizadores que ocupam discretamente seu lugar na canção, tudo numa gravação pacífica, feita para te confortar. O semi-silêncio arrebatador. Você terá que dar um volume a mais no seu som. Mas, pense nisso com um trunfo do grupo. Uma ação proposital. Talvez até mesmo para você encontrar mais detalhes. No final, camadas de vozes em duelo contínuo junto com mais instrumentos que se aglomeram. A antítese peso/leveza nunca foi tão bem empregada. ‘Boundaries’ deixa impregnada com firmeza uma das marcas do quinteto: belos dedilhados. Além disso, mais três ingredientes: bateria marcial, sintetizadores e aquela voz serena. Amálgama que não foge muito da canção anterior, mas que funcionará perfeitamente e absolutamente até o final.

‘Secular Ventures’ tocaria tranqüilamente numa rádio. Se tal meio de comunicação fugisse do conservadorismo que carrega como status até hoje. A mais grudenta do disco. Numa espécie de semi-orquestra, poucos vocais na composição, a banda deixa uma pérola de recordação. Xilofones também são o destaque do Kyte. A propósito de ‘Sunlight’. A música teima em parar, apresenta efeitos e chiados e volta a nos embalar com aquela percussão sinuosa. ‘Home’, a menor do disco, uma pseudo-vinheta até, é conduzida como um momento mais experimental e lúdico do Kyte. Mas não deixa de fazer feio.

‘They Won’t Sleep’ deixa cicatrizada em seu campo cerebral, por umas duas semanas, aquela melodia, aquele toque de sintetizador. Por mais que tudo se repita, você gosta e nem observa quase 7 minutos da música te sugar. ‘These Tales Of Our Stay’ fecha o disco com grandiloqüência. A mais épica, por sinal. Silenciosa nos instantes iniciais, vozes sussurradas, mas que vai arrebatando e se tornando compulsiva para depois da metade.

Acabou que detalhei as faixas sem cair em comparações (e olha que elas me vieram à mente). Como eu mesmo havia advertido. Outro fato que ocultei e deixei para o final do texto: os integrantes da banda, que sequer deixam seu sobrenome, tem faixa etária média de 20 anos. Eles conseguiram um disco e tanto – apesar de todo o anonimato. Volto a perguntar: Dom? Sorte? Predestinação? Não sei. Quero me esquecer disso enquanto ouvi-los por um bom tempo.

Banda: Kyte
Disco: Kyte
Ano: 2008
Gravadora: Kids Records
Nota: 8,3

Tags